EM OUTRAS PALAVRAS, BANDO DE CALANGOS!!!
Balanço do Legislativo revela atuação falha
Cientistas políticos afirmam que a maioria dos projetos aprovados dos parlamentares tem pouca relevância socialApesar
de garantida pela Constituição Federal de 1988, a independência entre
os três poderes enfrenta dificuldades de sair do papel. Diante dessa
falta de autonomia e amparado por bases ainda clientelistas, o poder
Legislativo, mesmo considerado oneroso aos cofres públicos, não consegue
exercer as competências que lhe cabem, entre as quais fiscalizar o
Executivo. A avaliação é de especialistas ouvidos pelo Diário do
Nordeste.
Apesar
de ter sido amplamente cobrado pela sociedade, o Congresso não
conseguiu aprovar uma reforma política que vigore já nas eleições deste
ano. A proposta de minirreforma eleitoral aprovada levantou
questionamentos Foto: Agência Senado
Na Assembleia
Legislativa do Ceará, por exemplo, foram aprovados, somente em 2013, 107
projetos de lei dos próprios deputados estaduais e outros 89 enviados
pelo Governo do Estado. Entretanto, parte considerável das matérias de
autoria dos parlamentares tem pouca ou nenhuma relevância social,
limitando-se a nomear ruas ou conceder honrarias a "personalidades"
cearenses e de outros estados.
O cientista político Francisco
Moreira, professor na Universidade de Fortaleza (Unifor), explica que,
inicialmente, o Brasil foi projetado para implantar o modelo
parlamentarista, no qual o Legislativo tivesse mais autonomia.
Entretanto, vigorou o presidencialismo. "Ficou um modelo tortuoso. Nesse
sistema não tem uma harmonia dos poderes", afirma.
Contradições
Ainda
de acordo com o especialista, a falta de programa dos partidos que dão
sustentação ao Executivo também gera uma interdependência entre os
poderes. Na prática, um Governo não consegue executar seu plano de metas
se não conquistar apoio das bancadas partidárias. "A inexistência desse
processo leva a uma série de contradições, que acabam culminando nos
atos de corrupção", elucida.
Em troca de apoio ao Executivo, o
alinhamento político desses parlamentares - nas esferas municipal,
estadual e federal - visa à sobrevivência política desses vereadores,
deputados e senadores e acaba configurando moeda de troca. "Eles ficam
tentando garantir a reeleição nos quatro anos de mandato e tendem a ir
para os partidos da base senão não sobrevivem". E completa: "Se for
olhar, a maioria dos projetos não tem objetivos no sentido de melhorar o
processo administrativo e o próprio legislativo, de trabalhar na
independência dos poderes".
Por sua vez, o professor de Ciência
Política Valmir Lopes, da Universidade Federal do Ceará (UFC), afirma
que os parlamentares não conseguem cumprir suas principais funções
asseguradas constitucionalmente. "Se olharmos na Constituição o que um
parlamentar deveria fazer, ele cumpre apenas o mínimo. O desempenho dele
é muito pífio", declara o docente.
Fiscalização
Uma
das principais competências do Legislativo é a fiscalização à atuação
do Executivo. Tomando o exemplo do Ceará, devido à ampla base de aliados
do governador Cid Gomes, os projetos do enviados pelo gestor não
encontram dificuldades de ser aprovados na Casa. Além disso,
questionamentos à gestão estadual acabam sendo abafados pelas
lideranças, que se empenham para camuflar possíveis irregularidades do
Executivo.
Para o professor Valmir Lopes, a oposição do deputado
Heitor Férrer (PDT) ao governo estadual, além de isolada, só ocorre
porque o pedetista tem um reduto eleitoral que permite essas
intervenções. "Na Assembleia, quem mais faz oposição é o Heitor Férrer,
que tem um voto de opinião, classe média e é deslocado do partido. Ele
expressa o interesse desse amplo segmento da classe média", atesta.
O
cientista político aponta que as emendas parlamentares, que são
liberadas pelo Executivo, também expressam a relação clientelista na
qual a política brasileira ainda é calcada. "A maioria dos parlamentares
ainda tem bases territoriais que se expressam através de clientelismo.
Ele faz a intermediação com o Executivo e deixa de cumprir uma das
funções mais importantes do Parlamento, que é fiscalizar as ações do
Executivo", afirma.
Argumento recorrente utilizado pelos
legisladores é a limitação de suas competências, tendo em vista que os
projetos não podem invadir o orçamento do Executivo. Para Valmir Lopes,
caso o Legislativo tivesse maior autonomia para deliberar recursos
financeiros, os projetos aprovados seriam prioritariamente para
beneficiar suas bases eleitorais. "Uma das soluções é alterar o sistema
eleitoral, que faz com que o parlamentar tenha bases eleitorais e
clientelistas para contar com as migalhas do Executivo", reflete.
Judicialização
Já
o cientista político Hermano Ferreira, docente da Universidade Estadual
do Ceará (UECE), acredita que está havendo um processo de
"judicialização", alegando que o Judiciário tem se apropriado de funções
do Legislativo. "O ativismo jurídico cria e revoga normas. No caso do
Brasil, está se intensificando". E completa: "No momento em que ele toma
a frente, minimiza o Legislativo".
Ainda de acordo com o
professor da UECE, parte da fragilidade do parlamento se dá pela falta
de expressão dos partidos políticos, fazendo com que as lideranças sigam
rumos individuais em busca de espaço junto ao Executivo. "As grandes
questões que deveriam ser discutidas pelo parlamento de certa forma
ficam em segundo plano. Não se pode ter democracia forte com partidos
acuados", defende.
Citando o caso do Ceará, Hermano Ferreira
ressalta que, pela Constituição de 1988, é muito pequena a capacidade de
o Legislativo controlar o Executivo. "No Ceará, ainda tem a questão do
PMDB em comparação com outros partidos. Eles sempre estarão do lado de
quem está no poder. O PSDB está completamente esvaziado e o governador
quase não tem oposição. Essa é a contingência de se ter uma democracia
muito recente ainda. Os partidos todos ainda são muito jovens", pondera.
LORENA ALVESREPÓRTER
Fonte: Diário do Nordeste On Line
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