As manifestações de 2013 contra os investimentos em obras para a Copa do Mundo de 2014 marcaram época no Brasil. Fortaleza, como cidade-sede, não ficou de fora. Milhares de jovens foram às ruas e colocaram a boca no trombone. Mas, na mesma época, a capital cearense viveu outros momentos de tensão: a ocupação do Cocó.
Passados dois anos do fato, o Tribuna do Ceará conversou com alguns personagens que vivenciaram noites em claro para dizer não à derrubada de árvores para construção dos viadutos da avenida Antônio Sales. Foi então que os manifestantes criaram o movimento “Ocupe o Cocó” e acamparam no local para protegê-lo.
O acampamento durou 84 dias e teve diversas atividades. Além de debates, houve palestras de professores, apresentações artísticas e até concurso de alternativas à construção do viaduto, onde foram apresentadas 12 propostas em favor da preservação do parque. O então governador do Ceará, Cid Gomes, visitou o local e conversou com os manifestantes para que eles desistissem da ocupação.
Gustavo Mineiro, estudante de Cinema, esteve na ocupação desde o segundo dia até o último. Colaborou com as atividades do acampamento, como estruturar a alimentação, organizar banheiro, fossa e eletricidade para todos. Foram montadas 60 barracas e havia um fluxo de 200 pessoas por dia, entre acampados e visitantes. “As pessoas passavam e olhavam curiosas. Uns apoiavam e outros criticavam, mas o fato é que começou a gerar um questionamento na cidade”, pontua Gustavo Mineiro.
O vereador João Alfredo (Psol) participou do movimento, passando parte do dia e dormindo alguns dias no acampamento. Anteriormente ele já havia participado de outras manifestações em defesa do Parque do Cocó. “Foi uma das experiências mais importantes que eu vivi em minha época de militância, um movimento social duradouro”, declara. O parlamentar tem um sentimento de frustração pela construção do viaduto mas também tem gratidão aos jovens que participaram ativamente da ocupação. “Eu passo por lá todo dia para ir trabalhar e vejo o engarrafamento. Vejo que a promessa foi vazia, e o que se queria, de fato, era atender aos interesses das empreiteiras”, critica o resultado.
Despejo dos manifestantes e confronto com a polícia
O despejo foi marcado pela violência. Aparelhos de choque, bombas de gás lacrimogênio e cassetetes foram utilizados pela Guarda Municipal e Batalhão de Choque para dispersar os manifestantes. Apesar disso, parte do grupo que estava acampado permaneceu no local como sinal de que não concordavam com a intervenção. De acordo com Rosa da Fonseca, militante do grupo Crítica Radical, naquele momento a indignação foi maior do que o medo e os fez resistir ao despejo.
“O lado positivo é que se fez um movimento que repercutiu na cidade toda e colocou em cheque a política urbana sobre o transporte, o domínio do carro sobre a vida das pessoas. Sensibilizou a nossa visão sobre a cidade, para a convivência coletiva, com o diferente, de solidariedade. Foi uma das minhas experiências mais fortes, como um embrião para uma vida nova”, analisa Rosa da Fonseca.
“Foi uma luta essencialmente coletiva e vinculada à defesa do planeta. A nossa indignação foi ver todo o aparelho do Estado, legislativo, governamental e policial cometendo uma ação, que sob todos os aspectos era ilegal, contra um grupo de pessoas que estava à favor da cidade. Mas fica como aprendizado de que é possível criar um movimento ecológico e, se não fizermos nada, vamos continuar sofrendo”, conclui a militante.
Em um momento de desesespero, o estudante Gustavo Mineiro tirou a roupa e tentou entrar no parque, mas foi contido pelos policiais, que usaram uma das faixas dos manifestantes para cobrí-lo. Ele foi preso e esteve detido por quatro horas. Respondeu a um processo de atentado violento ao pudor mas foi considerado inocente. Apesar disso, Gustavo não se arrepende do que fez. “É muito difícil lutar contra armas quando você só tem o seu corpo. Quando eu vi o trator derrubando as árvores pensei em tudo o que tinha feito e não queria aceitar que tinha chegado naquele nível de brutalidade. Eu percebi que não tinha mais nada a ser feito, e, impulsivamente, tirei minha roupa e fui em direção ao parque”, revive.
Dois anos depois, ao passar pelo local, ele só vê concreto e pessoas isoladas em seus carros. Mas também enxerga que é possível a sociedade se unir em prol de uma causa. “Aprendi que eu não estou só, e que uns conscientizam os outros. É o pensamento coletivo que torna a sociedade melhor”, conclui.
Compensação Ambiental
A Prefeitura de Fortaleza, por meio da Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinf), informa que finalizou, em março de 2014, o plantio de 600 árvores semi-adultas, como forma de compensação ambiental da obra dos viadutos das avenidas Engenheiro Santana Júnior e Antônio Sales. “Após a conclusão da obra dos viadutos, foi implantado ainda um projeto paisagístico no entorno dos viadutos onde foi realizado o plantio de mais 170 árvores ao longo das duas avenidas, totalizando 770 novas árvores plantadas somente na obra”, detalha em nota.
Local de plantio das mudas
Avenida Raul Barbosa (ao lado da pista de skate e campo de futebol): 150Anfiteatro do Parque do Cocó (Avenida Padre Antônio Tomás): 70Parque Adahil Barreto: 305Parque do Cocó (Eng. Santana Júnior): 75Avenida Antônio Sales e Avenida Engenheiro Santana Júnior: 170
Fonte>Tribuna do Ceará
Nenhum comentário:
Postar um comentário